Lewis Feuer, as pretensões dos intelectuais e a ascensão dos cientistas-filósofos
- Edgard Leite
- 7 de jun.
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Atualizado: 9 de jun.

Lewis Feuer (1912-2002), sociólogo de vasta obra, publicou, em 1976, um interessante texto chamado O que é um intelectual? Neste, analisou a longa jornada do conceito desde o momento em que o surgimento desse tipo de pensador pode ser observado.
Max Weber, com alguma premonição, nos lembra Feuer, entendeu de forma pioneira os intelectuais como "um grupo de homens que, pela virtude de suas particularidades, tem especial domínio de certos elementos considerados como de valor cultural e, portanto, tornam-se capazes de usurpar a liderança de uma comunidade cultural".
Tal caracterização, claramente depreciativa, mas bem real, nunca deixou de inspirar avaliações negativas sobre o papel desse importante setor da sociedade. O século XX elevou-os de simples estrato social a membros de um tipo de classe atuante na sociedade, composta normalmente de pessoas bem formadas, com ambições políticas, que manifestavam o desejo de, segundo Feuer, "permanecer fora do equilíbrio da estrutura social e do universo da cultura" manifestando "independência de pensamento".
Embora suas origens estejam na virada do século XIX para o século XX, o seu fortalecimento político maior deu-se, sem dúvida, a partir dos anos de 1960, com a ampliação das universidades em escala global. Pode-se dizer que as agitações acadêmicas dos anos 60 do século passado mostraram, pela primeira vez, o seu grande poder e influência ao conquistarem uma residência espiritual no mundo universitário. As universidades profissionalizaram o intelectual e tornaram-no apto a formular projetos e intervenções com uma dose crescente de primor técnico. Embora, sempre, de forma ideológica.
A questão é que as universidades também profissionalizaram um outro tipo de pensador, aquele que Feuer denominou de cientista-filósofo, acadêmico tornado especialista em diferentes campos de conhecimento, com significativa capacidade de intervenção em distintas áreas de pesquisa.
Feuer, em seu texto, toma como exemplo a União Soviética de seu tempo para mostrar que, ali (com efeitos que puderam ser sentidos em toda estrutura universitária mundial), processou-se um cisma entre os intelectuais, ideólogos, essencialmente, e os cientistas-filósofos. A estes, os primeiros gradualmente começaram a negar que pudessem ser considerados intelectuais.
A razão provavelmente está no fato de que, lidando com elementos ideológicos, claramente insustentáveis no tempo e na razão prática, os intelectuais não tinham a mesma inclinação dos cientistas em buscar a verdade. Já que é isto, basicamente, que os cientistas buscam. Por isso, portanto, cientistas-filósofos. Qualquer pensamento mais geral que emana dos cientistas tende a estar referenciado em verdades com as quais os intelectuais, com suas ambições políticas, muitas vezes tem dificuldade de lidar em sua plenitude.
Os intelectuais podem ter muitos interesses, na medida em que trabalham com política, ilusões, crenças insustentáveis e ambições diversas. E alguma verdade, é claro. Mas os cientistas-filósofos, no entanto, só parecem ter um único interesse: a ampliação do conhecimento, a construção dos mecanismos para que o conhecimento, por intermédio de sua verdade, se desenvolva e possa transformar aquele mundo que cerca o seu campo de conhecimento. Que pode ser pequeno, preciso, ou maior e impreciso - mas exigindo, em ambos, a experiência da verdade.
Para o cientista-filósofo não há conflito qualquer de interesse no exercício de sua ação política. O seu único interesse verdadeiro é o conhecimento e sempre trabalhará para buscar soluções para as dificuldades da pesquisa a ser realizada.
Mas devemos considerar que ambos, intelectuais e cientistas, gravitam em torno da universidade contemporânea, e são seus filhos. Assim, parece que ambos nunca hesitarão em defender as instituições produtoras de conhecimento quando estas forem ameaçadas por aqueles que as combatem. Pois o combate às universidade não é apenas combate às ideologias, como normalmente se diz, mas também, e principalmente, combate ao conhecimento, ou à busca da verdade.
Feuer, Lewis S.: “What is an intellectual?”in Gella, Aleksander (ed): The Intelligentsia and the intellectuals, theorem method and case study. Sage Publications, 1976. p. 47+
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