De Lucrécio a Foucault: a construção do esconderijo
- Edgard Leite
- há 4 dias
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Atualizado: há 2 dias

Texto da Conferência proferida no III Congresso Filosofia e Cultura. Deus e a Filosofia.
1- Lucrécio

O livro de Lucrécio, De rerum natura, teve grande influência na formação do pensamento contemporâneo. Esse poema epicurista foi elaborado em torno do ano 50 a.C., com o objetivo, parece, de difundir as doutrinas de Epicuro. O texto foi reproduzido durante a alta idade média em algumas cópias, mas sua leitura era restrita a círculos menores no universo cultural medieval.
Em 1418, no entanto, em tempos de reação à ideia de Deus, o poema foi redescoberto num mosteiro da Alemanha pelo intelectual e antiquário Poggio Bracciolini, e este, encantado, o emprestou ao colecionador florentino Niccolo Niccoli, o qual, por sua vez, o distribuiu por humanistas italianos. O livro passou a ser lido com crescente entusiasmo nos meios intelectuais europeus tanto em cópias manuscritas quanto, mais tarde, impressas, e já era extremamente influente, nos meios universitários, no limiar do século XVII. Foi, por isso mesmo, proibido em muitos lugares da Europa.
Como definiu Ada Palmer, "o epicurismo é uma forma de hedonismo filosófico". Assim se denomina aquele tipo de "pensamento próprio das escolas filosóficas defensoras da tese de que o bem mais elevado é o prazer (hêdonê, normalmente traduzido por voluptas em latim), ou seja, aquelas que não têm como objetivo superior um bem divino, espiritual ou cívico".
Para Epicuro, especificamente, segundo David Sedley, ”a dor é o único mal” e "o nosso principal objetivo deve ser minimizar a dor. Isto é alcançado, para o corpo, através de um modo de vida simples e, para a alma, através do estudo da física, alcançando-se o prazer supremo", isto é, "eliminando as duas principais fontes de angústia humana, os medos dos deuses e da morte". Mais precisamente, introjetando a percepção de que "os fenômenos cósmicos não transmitem ameaças divinas” e "a morte é mera desintegração da alma”.
Segundo tal tradição, a natureza é constituída por átomos que se dissolvem e se reagrupam de forma contínua. O mundo seria o palco de um processo anárquico, que continha uma forma qualquer de organização espontânea. Mas não uma ordem que derivasse de algo externo ao mundo, e que o ordenasse num dado sentido. Por isso Maquiavel anotou, em seu exemplar do Rerum natura, que ali estava delineada uma ideia muito específica de liberdade: "do movimento há variedade, e dele emerge uma mente livre [liberam habere mentem]”. Como dando a entender que a liberdade é experiência aleatória mas imbricada na natureza, fluindo com seu movimento simultaneamente caótico e eventualmente ordenado.
O fato principal, que nos interessa aqui, é que os epicuristas acreditavam que não existia nada além dessa vida, algo além dos átomos. Entender isso era importante, segundo essa tradição, para não temer a morte e não sofrer por ela. Não temer porque não precisávamos responder por nada da vida diante dela ou para algo ou alguém além dela. E não sofrer porque era inútil diante de sua absoluta transitoriedade.
2- Espinoza

Toda essa tradição materialista, com as suas variáveis e interpretações, teve grande influência no pensamento filosófico moderno e contribuiu para fortalecer as bases do fenômeno intelectual do Iluminismo. A filosofia clássica e seus desdobramentos medievais, bem como toda metafísica, e, principalmente, a poderosa presença da mensagem bíblica, pareceram, a círculos cada vez maiores de pensadores, por demais absurdas e ilusórias. Pura imaginação desconectada de um universo material, este a única dimensão que poderia ser totalmente conhecida, matematicamente, e que era, em si, desprovido de mistérios de origem imaterial. E, mais ainda, mundo carecente de sentidos que tivessem origem fora dele. Tal universo de átomos, surgido espontaneamente do vazio, se afigurou, para muitos, como modelo mais real do que aquele de um mundo material debruçado no precipício de uma imaterialidade milagrosa, fonte de sentidos inalcançáveis, surpreendente e incontrolável.
Baruch Espinoza deu eco a esse pensamento de uma forma decisiva. “A que ponto”, escreveu Espinoza, “o medo ensandece os homens! O medo é a causa que origina, conserva e alimenta a superstição”. E assim atacou os milagres: "o vulgo chama, portanto, milagres ou obras de Deus aos fatos insólitos da natureza e, em parte por devoção, em parte pelo desejo de contrariar os que cultivam as ciências da natureza, prefere ignorar as causas naturais das coisas”, ou: o milagre só pode ser entendido "relativamente às opiniões humanas e não significa senão um fato cuja causa natural não podemos explicar (ou, pelo menos quem escreve ou narra o milagre não pode explicar) por analogia com outra coisa que ocorre habitualmente”. Tal espírito se propagou por todo pensamento ilustrado, chegando, por fim, a Immanuel Kant, que estabeleceu a base de uma crítica geral à percepção clássica da imaterialidade.
Aquilo que aparentava ser extraordinário seria, portanto, para Espinoza e continuadores, fruto da ignorância de suas causas, e não expressão de algum movimento externo à natureza. Qualquer coisa poderia ser explicada à luz do conhecimento que se adquirisse sobre suas causas. E qualquer acontecimento seria previsível, uma vez que se conhecesse suas razões. O desenvolvimento da estatística, por exemplo, consolidado, entre outros, pelo esforço de Pierre Laplace em estabelecer a lógica da ocorrência e repetição de todos os acontecimentos do mundo de forma matemática, criou muitas expectativas sobre essa possibilidade.
3- Laplace

Laplace sustentou que “a curva traçada por uma simples molécula de ar ou vapor é regulada de uma maneira tão precisa quanto as órbitas dos planetas; a única diferença entre elas é a que advém de nossa ignorância”. Ou seja, a probabilidade é um mecanismo para alcançar o conhecimento de fenômenos desconhecidos. O que o fez explicar o que vem a ser o extraordinário: “este é o lugar para definir a palavra extraordinário. Organizamos em nosso pensamento todos os eventos possíveis em várias categorias e consideramos extraordinárias aquelas categorias que incluem um número muito pequeno de eventos”. O extraordinário é o excepcional estatístico. Por isso, assim consta, teria dito a Napoleão Bonaparte (1769-1821) que Deus, cada vez mais, “se torna uma hipótese desnecessária”.
Todo esse movimento, portanto, se desenvolve, de forma racional, para justificar uma existência na qual Deus não é necessário para o entendimento dos fenômenos. Onde o imaterial, o externo ao mundo, o excepcional (isto é, o imprevisível) não tem valor significativo no entendimento das coisas e na relação do Homem com o mundo. A vida é prisioneira do mundo. Todas as coisas se desenrolam num ciclo contínuo de retornos infinitos, que se retroalimentam continuamente. A realidade dessa desagregação, única visível, única perceptível, única ponderada matemática ou estatisticamente, ata o Homem a um eterno retorno ao conhecido e previsível. Aprisiona-o a um círculo de princípios, meios e fins, afasta-o da noção de determinação imaterial. Torna esta invisível ao olhar acostumado em tudo ver nascer e morrer infinitas vezes.
4- Entropia

A Entropia é um evento identificado a partir da observação das, assim chamadas, primeira e segunda leis da termodinâmica. John Gribbin entendeu como "indiscutivelmente a ideia mais importante e fundamental de toda a ciência" . O termo foi cunhado pelo físico e matemático Rudolf Clasius, em 1865. A entropia expressa um processo inevitável verificado em um sistema termodinâmico.
Segundo Robert Fleck: "A Primeira Lei [da termodinâmica] trata da constância da quantidade de energia em um sistema isolado". A Segunda Lei, que trata dos sistemas fechados, estabelece que, nestes, todo calor tende a se dissipar com o tempo, através de sua transferência de corpos aquecidos para outros frios. Este é o fenômeno da entropia.
É necessário anotar que existem três tipos de sistemas termodinâmicos: o sistema isolado, cujos limites não permitem transferência, para o espaço exterior, de energia mecânica, fluxo de calor ou troca de matéria; o sistema fechado, que permite transferência de calor para o exterior, mas não de matéria; e o sistema aberto, que permite a transferência tanto de energia quanto de matéria, para dentro e para fora do sistema. A pessoa é um sistema aberto. No entanto, segundo muitos, inserido dentro de um sistema isolado ou fechado: o universo material.
O pensamento iluminista sempre tendeu a postular, como, de certa forma, Lucrecio também, o universo como um sistema fechado (ou eventualmente isolado), o que significa que é sujeito, portanto, à entropia, à dissipação continua da energia e ao seu esfriamento e morte. A absoluta materialidade do cosmo, definindo-o como um sistema fechado ou isolado, implica na tese de que o Homem está de fato aprisionado a um eterno retorno do tempo. Tal universo sem excepcionalidades tem na morte a sua suprema realidade e a vida se lhe apresenta apenas como uma condição eventual dessa materialidade que é, em substância, inanimada, morta. Isso poderia levar, como levou a Buddha, muitos séculos antes de Lucrecio, a uma percepção de que além da vida e da morte só há o nada. E que a nossa experiência vital apenas seria um hiato entre o vazio e um outro vazio, ambos desprovidos de eternidade.
5- Condorcet

Mas, estranhamente e apesar da termodinâmica, a reação dos pensadores de matriz iluminista foi a de negar essa realidade terrível, porque a solução a ela seria a negação de qualquer valor ao eu e aos prazeres e a qualquer coisa que não fosse apenas a vivência da realidade da morte. O pensamento ilustrado, ancorado na ciência e em seu desenvolvimento vertiginoso, sustentou, portanto, e de forma crescentemente descontrolada, a crença na grandeza da mente do Homem e na sua capacidade de ser algo mais que o mundo, e cada um algo mais que todos.
As ilusões sobre a ciência, assim, não apenas melhoraram a vida do Homem. Mas também lhe levaram, eventualmente, a crer que era capaz de dominar o universo inteiro. Mesmo sabendo que este é efêmero, circunstancial e condenado, se for entregue apenas a si enquanto sistema fechado, ao seu esfriamento infinito, à entropia. Ainda assim se postulou, na modernidade, a crença no progresso, que foi concebida, de forma pioneira, por Condorcet:
"a natureza não estabeleceu nenhum termo para a perfeição das faculdades humanas; o limite do aperfeiçoamento do Homem é verdadeiramente indefinido; e o progresso desse aperfeiçoamento não tem outro limite senão a duração do globo sobre o qual a natureza nos lançou. Esse progresso, sem dúvida, variará em velocidade, mas nunca será revertido enquanto a Terra ocupar seu lugar atual no sistema do universo, e enquanto as leis gerais desse sistema não produzirem um cataclismo geral ou mudanças que privem a raça humana de suas faculdades e recursos atuais”.
Tal entusiasmado acobertou, a partir de então, um delírio contínuo de desesperos de toda ordem, científico, nacional, social, eugênico e político, que conduziu o Homem às maiores tragédias e carnificinas já registradas na história, e que culminaram na II Guerra Mundial. O desastre humano de 1914-1945, fruto direto de todo pensamento iluminista, na forma como se deu, recolocou a tradição epicurista e sua reinterpretação moderna em seu devido lugar de construtor do nada. Todo sistema fechado ou isolado é incapaz de produzir energia infinita, apenas a conserva ou a dissipa. A ideia de progresso sustentava a possibilidade de que o Homem poderia construir sistemas sociais alimentados por energia de maneira crescente e capazes de consumi-la em escala exponencial. Ora, a verdade é que apenas um sistema aberto pode permitir um fluxo contínuo de força que altere o material, realize o milagre e fundamente o extraordinário, inclusive, e principalmente, o universo em si. Mas tal processo exige que tal sistema seja aberto à eternidade e à imaterialidade. Pois aqui, a considerar as leis da termodinâmica, só há conservação ou dissipação. Parece evidente que a força que coloca o mundo em movimento está simultaneamente fora e dentro dele, portanto.
Os ecos dessa grande máquina materialista de entender a vida, na sua aridez e nas suas ilusões utópicas, continuaram reverberando pelas décadas posteriores em lugares distantes do seu epicentro, como no Camboja, por exemplo, na assustadora tentativa do Khmer vermelho em construir uma sociedade sem qualquer tipo de experiência extraordinária, imersa na total previsibilidade dos eventos. E que conduziu ao extermínio de quase um terço da população do país. Mas, evidentemente, tais crenças desesperadas assustaram as consciências mais atentas.
6- Lyotard

Jean-François Lyotard, no seu A condição pós-moderna, sustentou que o mundo pós-guerra estava dominado pela "incredulidade" diante das metanarrativas. E não podia ser de outra maneira. A prática de um mundo sem imaterialidades construiu uma sociedade desarticulada e aprisionada em ações cujo fim era o mesmo da natureza que espalhava: a dissipação da energia, a desordem, a destruição. A ideia de progresso era pura ilusão, que ocultava tal realidade.
Mas a dita pós-modernidade, ou o mundo que emergiu de Auschwitz e Hiroshima (e do colapso dos modelos metanarrativos do progresso e da revolução social), não ousou, mais uma vez, encontrar o nada. Nem tão pouco retornou imediatamente, de forma ordenada, para um entendimento do mundo como sistema aberto que repousa na eternidade, e que apenas dela pode retirar sua verdade de realidade transitória, enquanto puro surpreendente. Continuou-se a insistir num mundo atomizado, de átomos que se associam, se dissociam, e novamente se associam, criando a partir de si mesmos protocolos de funcionamento que se repetem infinitamente e que terminam sempre morrendo, ou apagando.
7- Sartre, Foucault

Não há ruptura entre a pós-modernidade e a modernidade no entusiasmo com que recusam as consequências da adoção do modelo epicurista: continuam sustentando que a experiência contínua do nada é algo a ser preservado, e realizado, no prazer de um momento sem medo. O próprio Jean-Paul Sartre, em seu revelador testamento filosófico, intitulado estranhamente de Esperança agora, sustentou que "a esperança sempre foi uma das forças dominantes das revoluções e das insurreições, e eu ainda sinto que a esperança é a minha concepção de futuro”.
A esperança de Sartre, um crente na liberdade caótica, parecida com aquela que entusiasmou Maquiavel ao ler Lucrecio, não é propriamente esperança, como a entendemos, uma virtude, mas uma expectativa de que a cada momento devamos ser cúmplices tanto da destruição contínua do mundo quanto da morte. Ou, como bem definiu Leon Trotsky, ao entender a revolução como um processo infinito no qual "cada etapa está contida em germe na etapa precedente, e só termina com a liquidação total da sociedade de classes”, isto é, com a liquidação sociedade que conhecemos. Está será, certamente, infinitamente destruída, pois quando será possível uma sociedade sem hierarquias e interesses divergentes ou contraditórios? Apenas quando deixar de existir.
Giles Deleuze, com profundidade, avançou nesse estranhamento do Homem no mundo ao conceber a vida como pura experiência de fragmentação temporal “com saltos, retornos, lacunas” onde se vive um eterno presente, que termina e renasce. Uma nova forma de conceber a reencarnação, ou, mais precisamente, a metempsicose clássica. Cada presente é repetição do passado com um novo olhar. Mas não há escapatória da morte vivida a cada instante como a maior das realidades. A vida se torna um sistema fechado, espelhando as realidades termodinâmicas do universo.
Ao que fomos reduzidos nessa jornada de fuga para a repetição? Certamente não se entende que o Homem tenha uma alma eterna, apenas modos diferentes de estar nos presentes. Sequer o que pensamos ser neste momento não é algo que possamos entender como substancial. Michel Foucault, em seu poderoso livro As palavras e as coisas, expressou a tragédia dessa existência sem Deus nem eternidade e o que isso significa para o Homem:
"Uma coisa é certa: o Homem não é o problema mais antigo nem o mais constante que se coloca ao conhecimento humano". "Como a arqueologia do nosso pensamento facilmente mostra, o homem é uma invenção de data recente. E talvez se aproximando do fim". "Se esses arranjos desaparecessem como apareceram e se algum evento do qual não podemos fazer mais do que sentir a possibilidade no momento, sem saber qual será sua forma ou o que promete, os fizesse ruir, como, no final do século XVIII, fez-se com o pensamento clássico, então pode-se certamente apostar que o homem seria apagado, como um rosto desenhado na areia na beira do mar”.
Comentamos, em recente oportunidade (A morada do Homem), que a natural consequência dessa linhagem intelectual é a dissolução da pessoa humana. O mesmo acontece no budismo, com mais lógica, no entanto, e coerência, pois este abandonou, definitivamente, qualquer sensação que pudesse valer a pena neste contínuo retorno dos momentos. Abdicando de qualquer hedonismo. A vaidade iluminista não permite tal conclusão. Talvez porque ainda se teime em reconhecer que a pessoa deva subsistir de alguma maneira, mesmo que fragmentada. Mas parece claro que o eterno retorno aprisiona a humanidade no seu contínuo colapso e dissolve sua dignidade metafísica, reduzindo-a a um rosto na areia da praia.
8- Adão

É aconselhável que retornemos a esses momentos fundadores do pensamento, a essas páginas tão extraordinariamente profundas que a tradição atribui a Moisés. Especialmente àquele momento em que, tendo cometido a transgressão fundamental, Adão e Eva fogem e se escondem: "mas o Senhor Deus chamou o homem, perguntando: 'Onde estás?' E ele respondeu: 'Ouvi teus passos no jardim e fiquei com medo, porque estava nu; por isso me escondi’” (Gn 3:9).
Não é difícil pensar que o auto isolamento no mundo dos átomos, e só nele, ou que a tese do fechamento em si do universo e o movimento de reclusão num tempo que é eterno retorno, é expressão intelectual da fuga do primeiro casal. Fuga de algo maior que o Homem, e diante do qual este deve responder na qualidade de fenômeno vital confrontado com sua origem, ou de evento diante de sua questão fundamental.
A ideia de que a experiência do abismo da eternidade deve ser fechado faz com que a consciência se volte para essa prisão entrópica onde se acredita que a alma deva se dissolver para sempre, sem encarar o próprio mistério de sua extraordinária existência. Somos espumas no rio Ganges, como pretendia Buddha, ou faces na areia da praia, como entendia Foucault? Seremos prisioneiros em um desaparecimento contínuo?
Parece sensato reconhecer que a capacidade humana de decidir para o bem acaba por buscar romper as barreiras dessa prisão voluntária no mundo. Porque a eternidade, a todo momento, se volta para a escuridão do universo, para onde fugimos, e nos pergunta “Onde estás?”
Mas essa pergunta só pode ser ouvida se nos voltarmos para um sistema não isolado nem fechado, mas sim aberto e de horizontes infindos que tanto engendra o inexplicável mistério da entropia quanto torna possível a sua reversão. Isso nos permite ouvir os passos dessa dimensão infinita e sem tempo, fonte de todo extraordinário, que é tudo. Dessa maneira pararemos de fugir e de nos esconder.
A crença em um universo de átomos, apenas material, é a grande herança que recebemos da tradição de Lucrécio. Ela nos concede certezas sobre um mundo que deve ser sempre previsível e imerso num eterno retorno temporal. Na verdade, é esta herança um dos maiores esconderijos concebidos pela consciência humana para evitar os horizontes vertiginosos do infinito.
Referências
Palmer, Ada. Reading Lucretius in the Renaissance. Cambridge, Harvard, 2014. p.7
Sedley, David N. “Epicureanism"in AUDI, Robert: The Cambridge dictionary of Philosophy, Cambridge, 1999, p.270
Brown, Alison: The return of Lucretius to Renaissance Florence. Cambridge, Harvard, 2010. p.74
Espinosa, Baruch: Tratado Teológico-político. Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 2014. pp. 203-206
Laplace, Pierre Simon. A Philosophical Essay on Probabilities. New York: John Wiley and Sons, 1902. p. 6 e p.17
Baker, Eric. “Lucretius in the European Enlightenment”. In: Gillespie, Stuart and Hardie, Philip (ed.). The Cambridge Companion to Lucretius. Cambridge, 2007. p. 274.
Apud Fleck, Robert: Entropy and the Second Law of Thermodynamics. Springer Nature Switzerland 2023. p. 40
Porter, Theodore: "Statistics and physical theories" in NYE, Mary Jo (ed.) The Cambridge History os Science: volume 5: The Modern Physical and Mathematical Sciences. Cambridge University Press, 2008 p. 494
Fleck, Robert: Entropy and the Second Law of Thermodynamics. Springer Nature Switzerland 2023. p.56-57
Anderson, Greg: Thermodynamics of Natural Systems. Cambridge University Press, 2005. pp.10-11
Condorcet, Nicolas de: "Sketch for a Historical Picture of the Progress of the Human Mind" in Condorcet, Nicolas: Political writings. Cambridge, 2012
Lyotard, Jean-François: A condição pós-moderna. Rio de Janeiro, José Olympio, 2009.p. XVI
Sartre, Jean-Paul: Hope now: the 1980 interviews. The University of Chicago Press, 1996. p.110
Williams, James: Gilles Deleuze’s Philosophy of Time: a Critical Introduction and Guide. Edinburgh University Press, 2011. pp.70-74
Foucault, Michel: The Order of Things: An archaeology of the human sciences. London, Taylor and Francis, 2005. Pp. 421-422
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